terça-feira, 26 de outubro de 2010

Criança Cósmica

Por: Ramiro Valdez          

    
          Viver é ser. Ser (materialmente) é sofrer.  Então... ser ou não ser? Não ser seria mais fácil? Se eu não fosse saberia, porém se eu não fosse, não seria, e nunca poderia saber como é o não ser. Nada seria. Se nada ser seria nada, como compará-lo a ser? Mas ser enquanto ser humano é ter noção da própria existência. Ter noção da própria transitoriedade, decadência. Orquestrar a vida com sapiência. Rimas surgindo, deveria ter escrito uma poesia. Mas nunca escrevi poesia. Minto. Já tentei. Tentativas tardias. Tardias... tarde em relação a quando? Em relação a quando? A quatro, cinco, vinte milhões de anos. O tempo é a alteração do espaço. Alteração do espaço: efemeridade. Sim, a vida é só uma dança. A música: tempo, mudança. A melodia é bela, eterna. Dancemos!,  a cada compasso estamos mais cansados, e a canção não para. Uma criança cósmica, na sua divina inocência – pureza -, deu à matéria vida, e à vida consciência. Disse,com doçura: “vai ser humano, ama o outro e busca a transcendência”.  Mas a vida consciente da efemeridade ciente falhou em seu objetivo: tirou doce de criança. Agora vaga por aí querendo transformar o ar em ouro, o mar em ouro, a terra em ouro - o amor é ao ouro; foda-se o outro. Mata esse, desmata aquele, desmata mata, “queremos dinheiro e tesouro!” e sem nada aprender, nesse paranóico complexo de Midas, se encaminha à velhice, domingo da vida.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Uma Roda Gigante: Shiva, Shiva, Shiva Shambo! Mahadeva Shambo!

Por: Yam CHristo Reis

             Eu sou ingênuo, mas não me iludo. É muito engraçado isso, cara: como as pessoas se iludem com as sensações artificiais que o sistema social lhes apresenta. Vou ser mais concreto. Eu vejo, por exemplo, pessoas que falam de amor de uma forma que a gente sente que é verdadeira. No entanto estão falando de um amor individualizado, limitado, fragmentado e pessimista. Estão falando de um relacionamento que tiveram em um meio artificial, permeado por valores artificiais e que, portanto, torna-se um relacionamento frustrado. Daí surge uma conclusão equivocada em relação ao amor. Conclusões erradas pelos motivos errados. O amor em si não é intangível, mas a forma como as pessoas amam em um meio artificial o torna. Desacreditar nesse amor que presenciaram acaba tornando-se ordinário. Inspiração para tantas músicas tristes. Causa de tantos entendimentos niilistas e desentendimentos emocionais.

            Final da Libertadores. Milhares e milhares de colorados em uma só voz torcendo por seu amor em comum. Muitos amigos meus são colorados e eles me dizem: cara, não julga o futebol, não tira conclusões precipitadas e não te investe de preconceitos. O futebol une as pessoas. Tu não tens idéia da emoção que é celebrar um título destes em meio a milhares de pessoas que torcem por um objetivo em comum.


{Um parênteses (Quantas pessoas de bom nível intelectual já ouviram falar – inclusive estudaram muito sobre isso- da porra da POLÍTICA DO PÃO E CIRCO! Manjadíssima mundialmente. Percorreu milênios históricos para ter o ápice da eficácia neste nosso país de populismo mundano. Bolsa family e football pra vocês! Macacos azuis de um lado e vermelhos do outro. Olha lá, vai começar e... FIGHT!! Jamais serão! Chamá-los de macacos é uma ofensa gravíssima aos macacos.) longo, porém inevitavelmente necessário.} Perderei algumas visualizações por isso?...
           

            Bem, eu gosto muito de exercícios de imaginação, então imaginemos o seguinte: milhares e milhares de pessoas protestando seus direitos frente seus governantes. Um movimento unificado e simultâneo em todo o nosso país – quiçá nosso planeta - exarando energia em prol de uma sociedade melhor. Ou então – melhor ainda – imaginem milhares e milhares de pessoas em um círculo gigante, todas de mãos dadas, rezando cânticos de amor em uma só voz, dividindo amor e energia numa ciranda magnética de poder jamais antes vista. Isso não seria muito melhor? MUITO MELHOR MESMO?! Hahahahahaha! Isso seria sensacional.
           
            Emoções são diferentes de sentimentos. As emoções podem ser reproduzidas em qualquer lugar, por qualquer motivo, de qualquer forma. Se eu pensar - tentar lembrar um momento ruim – estarei resgatando aquela emoção vivida. No entanto ela não se fazia presente até que eu a resgatasse pelo meu pensamento/memória. Portanto as emoções, assim como o meio artificial e os valores artificiais, são também artificiais. Já o sentimento – aquilo que se sente – esse sim é verdadeiro. A distinção entre os dois somente é alcançada por um grau muito elevado de conhecimento e sabedoria.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

WTF?!?!? Brainstorming

Por: Pedro Bigoli


               Segunda-feira, precisamente às 23:21. Em meio a uma conversa no MSN eu tive uma epifania, por assim dizer. Quando eu emendei "tecnologicamente selvagem rotina" e "superficialmente profundo", vi que a mente tava começando a fertilizar e que alguma coisa ia sair de lá, nem que fosse adubo.

               Caralho! Que mundo é esse em que a gente vive?? A gente estuda pra estudar mais, aí se gradua no colégio. A gente faz a prova pra que a gente estudou todo esse tempo (sim, o vestibular é o foco das instituições de ensino, quando deveria ser MUITO mais abrangente e prático nas nossas vidas) para estudar mais. Depois, a gente trabalha uns 30 anos e quando se aposenta vai ter tempo pra curtir. Charles Chaplin já dizia que a vida começa onde deveria terminar! Primeiro nós somos velho e sofremos todas as mazelas e debilitações físicas e vamos aos poucos adquirindo a responsabilidade de trabalhar. Trabalhamos, juntamos grana e aí vamos estudar. Estudamos, e nossas responsabilidades vão diminuindo, até sermos uma criança irresponsável e ingênua, feliz com as maiores imbecilidades. Os últimos 9 meses passaríamos no útero da mãe, aconchegante berço do ser e, por último, tudo se terminaria num orgasmo.

               Eu sei que isso é impossível, então busco soluções no campo prático. Perplexo com a forma como o mundo se encontra, busco gente que tenha um pouco de humanismo para me relacionar. Esse humanismo implica em uma série de percepções que, quando materializadas e compartilhadas, geram uma sensação muito boa que eu ainda não encontrei palavras pra descrever. É tipo um "!", sabe? Enfim, são essas pessoas que me fazem ver que não está tudo perdido, que o mundo não pode ser mudado, mas o NOSSO mundo pode, esse sim pode. Ora, somos nós quem decidimos o que vai ser de nossas vidas. Nós escolhemos nosso modo de agir, pensar, falar e ser. Ser e não parecer ser ou ter. Na essência mesmo, lá no nosso mais intrapessoal, íntimo e abstrato.

               O autoconhecimento é um processo longo, cansativo e doloroso. Causa medo e desgosto, frustrando expectativas. A questão é aprender a lidar com isso e ouvir o que o nosso Galvão Bueno tem para dizer. A intuição é fantástica e me fez encontrar muitas pessoas com quem mantenho contato e inclusive faço sessões semanais de terapia leiga e mútua. Essa voz, até já referida pelo Yam numa sacada genial, nos responde várias questões quando estamos em conflito ou quando solicitada (ou não).

               A vida é um aprendizado. Nós somos o conjunto de nossas experiências e com elas temos o critério de análise dos fatos que ocorrem sequencialmente, num conjunto de eventos infinito. Cabe a nós, portanto, dar um sentido às várias imagens que demandam significado incessantemente. Com base nisso, a gente pode decidir em que mundo a gente vive. Eu estou tentando mudar o meu e fico feliz por começar a ver os frutos das sementes que eu plantei durante a minha existência.

               Isso não significa que estou contente com o que vejo, pois há acontecimentos que fogem do meu alcance. Mas a moral da história é: sintam mais, pensem mais, sejam mais, amem mais e vivam muuuuuuuito mais. O mais não é cronológico. Aliás, é atemporal: foge das linhas do tempo tamanha a intensidade com que se vive. E é essa nossa efêmera eternidade.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Alguns Registros do Diário Consciencial - Despretensiosamente os escrevi; Despretensiosamente os ofereço.

From: yamreis@hotmail.com
To: yamreis@hotmail.com
Subject: RE: cronica resignação filosófica
Date: Mon, 4 Oct 2010 14:31:24 +0000

            Eu tenho um armário lotado de roupagens. Escolho todos os dias qual roupagem eu usarei. Escolho dos pés à cabeça, também minha máscara, também meu comportamento. Mudo de roupagens até mais de uma vez por dia. Com cada uma delas me apresento frente às exigibilidades sociais. Até o momento em que me econtro com os olhos cansados e não tenho mais força para sustentá-la - sei que preciso voltar para casa. A minha casa não é a minha casa. Ela é dentro de mim, dentro da minha imaginação, atrás dos olhos. Se eu sou louco? Claro que sim, do contrário não teria de onde sair tanto conteúdo. Somente uma uma consciência muito lúcida para ter conhecimento de como funciona a sua loucura. Eu não tenho medo, pelo menos eu estou aprendendo como a minha funciona, e está dando certo. Na verdade eu tenho muito gosto por isso; posso brincar com as possibilidades; posso brincar com as palavras e diversas formas de expressar o universo dentro de mim. Gosto também de ficar observando como isso funciona nos outros. Chego a conclusões maravilhosas. Me deparo com mistérios unos - mistérios do universo. A vida serve pra isso meu caro. Na verdade eu tenho pena de quem ainda não percebeu que viver é ser, e para ser não há que se falar em mentiras e hipocrisias mas tão somente em aceitação da verdade de si. Você precisa trabalhar com a verdade palpável e imperecível do seu ser se quiser mudar a natureza do que você é. E não é fácil fazer algo que é transformar-se realmente. É preciso muito trabalho, muita vontade, muita análise e reanálise. Incidir em erros e erros e erros- parar o mundo, o tempo e o espaço- filosofar, psicodialogar, autoanalisar-se para ser melhor. Ser melhor!

From: yamreis@hotmail.com
To: yamreis@hotmail.com
Subject: RE: cronica resignação filosófica
Date: Fri, 1 Oct 2010 14:04:57 +0000

            Terei sempre de encarar meus resgistros com humores diferentes; olhar para minhas formas passadas com naturalidade é um exercício de auto-conhecimento. Jogar com as cartas na mesa pode ser mais difícil; as vezes pensarão que eu estou blefando; outras pagarei o preço por abrir o jogo. Contudo o grande lance das cartas expostas é justamente retirar-se do jogo, rasgar as regras, brincar com as possibilidades... Não penso em ninguém além de mim; não penso em mim além de ninguém. Nós damos muita importância à opinião das pessoas porque damos muita importância à nós mesmos. Somos meios; não fins. Então por que preocupar-se, limitar-se, comprometer-se? Nós somos os donos, os senhores, os legisladores de nós mesmos. Os únicos que podem permitir ou restringir nós mesmos. Façam suas leis, façam quantas emendas quiserem às suas constituições, a legitimidade é você mesmo, a realidade é a sua, a sua realidade é você.  

From: yamreis@hotmail.com
To: yamreis@hotmail.com
Subject: cronica resignação filosófica
Date: Thu, 30 Sep 2010 14:41:12 +0000


Resignação filósofica.
            As vezes me pego pregando peças sobre mim mesmo. E como é intrigante a forma como nós podemos ser tão intolerantes e exigentes conosco não é? Por que nós deixamos isso acontecer? No entanto, mesmo consciente, estes momentos tendem a ser inevitáveis como parte de um ciclo que está sempre se desenrolando de forma dialética. Chegamos sempre às mesmas conclusões que já tínhamos antes. Acredito que este momento pontual pós-ciclo dialético é ótimo para escrever. É um momento de clareza onde nós podemos enxergar exatamente o caminho mental que percorremos; nossos comportamentos ao decorrer- e é importante registrá-lo para termos um remédio psicológico cada vez mais eficaz denominado memória. Construir e reconstruir quantas vezes for necessário. Um belo sorriso deve ser escancarado para dar-nos leveza; para vermos o caminhar como passear pelos aprendizados da vida rumo à consciência.
            Da próxima vez estarei mais calmo. Vou me lembrar das situações pelas quais já passei para resgatar a força latente. É tudo uma questão de saber usar o bendito remédio da memória. Depois de feita nossa revisão- o período de resignação filosófica- estamos leves e preparados para continuar vivendo sem complexidade. Ser mais feliz do que nunca com as coisas mais simples do mundo. Temos o poder de hiperbolizar as figuras de linguagem da vida... positiva ou negativamente.

sábado, 2 de outubro de 2010

Reflexões sobre o Direito da Loucura

Por: Pedro Bigolin

Partindo do pressuposto de que já não basta o polêmico conceito de inimputabilidade, cabe, consequentemente a nós fazermos a seguinte indagação: o que é loucura? Ou ainda, o que é ser normal? O conceito de loucura não é unívoco. Não se pode admitir que exista um conceito de loucura vagando pelo mundo platônico das idéias, aos poucos sendo desvendado pela ciência. A loucura sempre foi, em todas as sociedades, uma questão de como a pessoa se relaciona consigo mesma, se relaciona com os outros e, principalmente, como vê o mundo e como por este é vista. Alguém pode ser considerado louco em um determinado contexto, e ser um líder, um xamã, em outro.
O que podemos verificar é que prevalece ainda no Direito uma noção desumanizadora da loucura, fruto do desenvolvimento do racionalismo e do positivismo tão arraigados às ciências desde seu princípio. Nesse processo de desumanização, a loucura torna-se uma entidade, equiparando-se à doença. Ela passa a ter uma vontade que supera a própria vontade humana, deslegitimando o tão discutido princípio filosófico do livre arbítrio.
Embora reputando irresponsável e inimputável o louco, porque tomado por uma entidade não-humana com vontade superior à sua, fazendo-se a punição por essa doença – a medida de segurança. Esse instituto pune a loucura, sob o fundamento de nem sempre ser explícito de a desmascarar, arrancá-la do ser humano. E que, se de resto acaba restringindo a liberdade do portador da doença, por via de um internamento que, se no discurso é não punitivo, na prática lhe arranca a liberdade e a voz.
Isso se deve porque ali onde um desavisado vê uma pessoa privada de liberdade por força de uma medida de segurança, o Direito vê diferente: a loucura seria algo não-humano, e a pessoa portadora da loucura seria um esvaziado hospedeiro, cuja vontade fora sobrepujada. “Na situação extrema o louco não age, mas sim é agido. Quem fala com sua voz, quem anda com suas pernas, quem olha com seus olhos não é ele: é a doença.”, afirma Fuhrer¹, imbuído dessa ideologia ao estudar a medida de segurança.
Nesse sentido, a medida de segurança, mais do que uma defesa social, seria uma paradoxal defesa da pessoa portadora da doença mental contra a sua própria loucura. Ou seja, o objetivo declarado dela seria salvar o louco de sua desumana insensatez, o que não deixa de ser paradoxal.
Baseada na concepção kantiana de pessoa como fim, e não como meio, a cultura ocidental resgatou o conceito de dignidade da pessoa humana, notadamente após a segunda guerra e seus horrores. A Constituição da República Federativa do Brasil, na verdade, o elege como fundamento no seu artigo 5º. O problema é quando se fala em dignidade para os tidos como loucos e psicóticos, no plano tradicional da visão sobre a loucura. Ao tratar da dignidade, os autores buscam sua raiz na autonomia, na sua autodeterminação, sem ser compelido por forças externas. Porém, nada se fala no tocante à autonomia tolhida pelas forças internas.
Sendo assim, é preciso que se construa uma noção de cidadania que não seja externa ao próprio psicótico, que não o exlua a priori por estar além ou aquém da sua própria capacidade enquanto ser humano pleno e diferente, como de resto todos nós somos.
Outro aspecto a ser evidenciado é que, analisando os princípios atinentes ao direito sanitário e neles constituídos os princípios atinentes ao sistema único de saúde, há uma contradição gritante entre a medida de segurança penal e o discurso ideológico que a lastreia, considerando-se que os estabelecimentos onde se cumprem as medidas de segurança são considerados estabelecimentos hospitalares (art. 99 do Código Penal) quando, estranhamente, não integram o sistema único de saúde e sim o penitenciário. Isso significa que não são regidos pelos princípios do SUS (CF art. 196 e seguintes, Leis nº 8080 e 8142/90), mas pelos princípios da execução penal (Lei nº 7210/84).
Notoriamente, não é fácil entender como um penalista e um constitucionalista poderiam harmonizar essa contradição principiológica. Afinal, a instituição do hospital público e a instituição penitenciária são regidas por princípios absurdamente diversos e incongruentes entre si. Portanto, não há como defender que a medida de segurança tem natureza sanitária e não punitiva sem evidenciar a contradição de um “hospital” submetido ao sistema penitenciário, e não ao Sistema Único de Saúde.
 À medida que os estudos da complexamente e humanamente mente do nosso ser evoluem, já é possível dizer que todos apresentamos algum tipo de neurose, mania ou psicose. Isso implica dizer que aquela sua vizinha que passa o dia inteiro na janela é louca, o executivo multimilionário que vive cercado por armários em ternos é louco (e os armários também). Além desses, aqueles que regulam o nosso modo de viver, agir e pensar também são loucos! Vocês são loucos! Eu, o Yam e o Felipe somos loucos, muuuuito loucos! Até aí não necessariamente representa uma ameaça à sociedade, conquanto não haja nenhum Simão Bacamarte com uma Casa Verde, pois essa não comportaria a inúmera demanda de internações sugeridas pelo Alienista.

Trabalho apresentado na disciplina de Psicologia aplicada ao Direito (não falei de nenhum deles durante a apresentação, antes que algum engraçadinho pense nisso hehe)